quinta-feira, 5 de novembro de 2015

INÍCIO DO SÉCULO XX ATÉ A PUBLICAÇÃO DO RELATÓRIO DO CLUBE DE ROMA

Que me desculpem os que leram sobre o Clube de Roma, publicado em 2007, contudo a postagem, agora retomada, pretende expor, com maior sistematicidade, a evolução do conceito do desenvolvimento sustentável. 

O conceito de desenvolvimento sustentável (embora não seja consensual) está bem disseminado nos diversos meios sociais, culturais, científicos e políticos. O mais citado, por diversas razões, quer concordemos  ou não com ele, estabelece que o “Desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades” (Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento-CMMAD, 1988, p. 46).

Não se ignora que a preocupação científica com o meio ambiente (na verdade, recursos naturais. Veja a famosa função de produção) é bem mais antiga, ou seja, em termos de estudos econômicos sistemáticos temos desde Adam Smith e, mais especificamente, desde Thomas R. Malthus em seu “Ensaio sobre o Princípio da População”. (Veja a minha postagem denominada “Da Riqueza das Nações ao Desenvolvimento Sustentável da Rio-92”, no qual o enfoque se refere à disseminação do conceito nos diversos organismos e governos internacionais).

Ressalta-se que esse conceito ( e o de outras vertentes científicas) não surge de imediato e sim é uma construção histórica que deve ser resgatada, sempre. Ele evoluiu de uma visão centrada na conservação e preservação dos recursos naturais para a interação do Homem com o meio ambiente. Vou focar a presente análise no século XX, somente, pois, é nesse período que o meio ambiente passa a ter preocupação política e social internacional, a globalização dos impactos ambientais  e, principalmente, há o reconhecimento da responsabilização humana por eles.

Existem diversos movimentos simultâneos (no tempo e espaço) que levam ao conceito, cujo pano de fundo são os impactos e os movimentos ambientalistas, que levaram à presente discussão ambiental.

Historicamente, houve a Convenção Europeia para a Proteção dos Pássaros Úteis à Agricultura (1902). Em maio de 1908, ocorreu a Conferência da Casa Branca sobre Conservação (mais conhecida como Conferência sobre Conservação dos Recursos Naturais), na qual o Presidente Theodore Roosevelt, em reunião com governadores, empresários, universitários e cientistas discutiu a preservação dos recursos naturais (no sentido de proteger a natureza para fins econômicos). Ele alertou para os problemas do desmatamento, exaustão do carvão, gás natural, o ferro e petróleo assim como a poluição dos solos e água em função do enriquecimento e progresso (há mais de 100 anos!!!!). Como resultado, foi criada a Comissão Nacional de Conservação e 41 estados criaram comissões de conservação.

Aconteceram outros encontros internacionais que objetivaram a discussão da natureza, tais como: Congresso Internacional para a Proteção da Natureza, em 1909 (como resultado, em 1913, foi criada a Consultative Commission for the International Protection of Nature, extinta em função da I Guerra Mundial, em 1914 e retomada em 1928, mas que também durou pouco); a Convenção sobre a Foca Peluda do Pacifico Norte, em 7 de julho de 1911, com os EUA e Canadá.

Em 1923, realizaram-se a Convenção para a Proteção dos Cardumes de Bacalhau do Pacífico Norte e do Mar de Bering e o I Congresso Internacional de Proteção da Natureza, em Paris. Em 1927, houve a Conferencia sobre a Proteção de Aves Aquáticas Migratórias, em Genebra. Em 24 de setembro de 1931 foi assinada a Convenção Internacional sobre a Regulação da Caça à Baleia (entrou em vigor em 16 de janeiro de 1935. Houve, em 1937, 1945 e 1946,  convenção sobre o mesmo tema). 

Ocorreu também a Convenção para a Conservação da Fauna e da Flora em Estado Natural, em Londres, no ano de 1933. Em 1940, deu-se a Convenção sobre a Proteção da Natureza, da Fauna, da Flora e das Belezas Naturais Cênicas dos Países da América (houve também do Hemisfério Ocidental, no mesmo ano).  Em 1948, a UNESCO e o governo francês patrocinaram um Congresso internacional para a criação da União Internacional para a Conservação da Natureza e dos seus Recursos (UICN). A Conferência Cientifica das Nações Unidas sobre Conservação e Utilização dos Recursos Naturais, em Nova Iorque, por sua vez, ocorreu no ano de 1949 analisou a gestão dos recursos depois da II Guerra Mundial. Em 1968, a Organização das Nações Unidas (ONU) convocou a "Conferência intergovernamental de peritos sobre as bases científicas da utilização racional e da conservação dos recursos da biosfera", organizada pela UNESCO, em Paris.

Alberto José Sampaio, em seu livro Biogeographia Dynamica (1935) citou 62 congressos realizados entre 1884 e 1935, que tinham o tema Proteção da Natureza (publicado no livro de José Luiz Andrade Franco e José Augusto Drummond, “Proteção à Natureza e Identidade Nacional, anos 1920-1940”, pp.108 a 111). Na verdade, esse número de encontros é impressionante, dado que temos a veiculação de poucos e importantes congressos, mas que não nos dão a visão dessa dinâmica, que embora centrada em alguns países desenvolvidos ocorreram internacionalmente.

Tem-se também  vários livros lançados, em particular, o Livro do economista inglês Arthur Cecil Pigou (1877-1959), “A Economia do Bem-estar” – The economics of welfare, em 1920. O autor apresentou o famoso conceito de externalidade utilizado intensivamente por quem é da área ambiental. Pigou tratou dos aspectos econômicos do bem-estar de uma coletividade. Para ele, a existência de uma externalidade provocava uma divergência entre os custos ou benefícios sociais e os custos ou benefícios privados. Quer dizer, uma empresa que não se preocupa com os impactos produz externalidade negativa e sua produção ocorre a um preço mais baixo do o Ótimo social (externalidade negativa). Para eliminar essa externalidade ele propõe a intervenção do Estado com impostos e subsídios.  (Pigou é o mais famoso, mas há um consenso de quem se referiu, primeiro, a palavra “economia externa” foi Alfred Marshall, no livro Princípios de Economia, em 1890.

Houve também a publicação do livro “La Biosphere” (A Biosfera), de Wladimir Vernadsky, no qual conceituou biosfera, em 1926.

Paralelamente a esse crescente científico e social, ocorreram avanços na utilização dos agrotóxicos. Só para lembrar: o primeiro inseticida foi inventado em 1874, por Othomar Zeidler. Em 1939, Paul Müller (químico da Geigy) descobriu ou evidenciou as propriedades do DDT (chamado de O Pesticida Maravilhoso) e ganha o Premio Nobel, de 1948. Anteriormente ao DDT existiam inseticidas com base em compostos de arsenio, altamente tóxicos e perdiam rapidamente a efetividade. Segundo o Clube da Química, após a II Guerra Mundial, o DDT começou a ser utilizado tanto para propósitos de saúde pública quanto, principalmente, em áreas de clima quente e de forma extensiva em países em desenvolvimento para combater pragas de insetos em lavouras agrícolas (árvores frutíferas, lavouras de verduras, plantações de algodão). Em 1950, Howard Burlington e Frank Lindenman (Universidade de Siracusa, EUA), demonstraram que o DDT perturbava o sistema hormonal (feminilizava os galos). Nessa mesma época, ocorreu a Revolução Verde, com o uso intensivo de agrotóxicos (que reduziram a diversidade de espécies agrícolas) e equipamentos agrícolas pesados, que nos anos 60-70, dissemina-se pelo mundo.

Não se pode esquecer também que houve, anteriormente, diversos outros impactos ambientais pontuais. Como exemplo, no início dos anos 1950, na Inglaterra, houve o fenômeno dos "Smogs"  (termo inventado pelo Dr. H.A. des Voeux, para designar a mistura de fumo - smoke - com nevoeiro - fog), com oito mil mortes. (Veja outros acidentes na minha postagem “Maiores acidentes ambientais antrópicos” e “Acidentes ambientais antrópicos atualizado”)

Como pano de fundo, as décadas de 1960-70 são caracterizadas pelo conflito entre os desenvolvimentistas e preservacionistas. Além disso, ao que tudo indica, as preocupações ambientais estavam circunscritas a sociedade civil dos países desenvolvidos.

A responsabilização social e ambiental humana ocorreu, como marco histórico, com a publicação de a “A Primavera Silenciosa”- Silent Spring (abaixo o link), de Rachel Louise Carson, em 1962.
Nesse contexto, o livro de Rachel Carson alertou sobre  o uso  de pesticidas e inseticidas e seus impactos sobre o meio ambiente e o Homem. 

Segundo Carson (1962), o que está acontecendo com os animais na Flórida, nos rios da Inglaterra, no Báltico, no Ártico, nos Grandes Lagos ou no Lago Baikal na Sibéria, tem relevância imediata para os seres humanos. O estrógeno que circula nas tartarugas é o mesmo que corre pela corrente sanguínea dos seres humanos.
A Primavera Silenciosa levou quatro anos para ser escrito e foi publicado em 1962, pela Fawcet Crest Book, a 95 centavos de dólar. Era um livro de preço acessível e de fácil compreensão pelas pessoas. Embora de grande repercussão, nos países desenvolvidos, o livro teve oposição das grandes empresas (claro). Com isso, só após a sua morte, aprovaram-se algumas leis (em 1964, 1980). Somente, entre  4 e 10 de dezembro de 2000, a Assembleia Geral das Nações Unidas, graças ao trabalho de Carson, considerou oito pesticidas nocivos ao ambiente e à saúde e proscritos pelos países signatários, a saber: Hexaclorobenzeno, Endrin, Dodecacloro, Toxafeno, Clordano, Heptacloro, Aldrin e Dieldrin. Notem que ela tinha estudos científicos e levou um tempo para ter resultados, mas houve avanços.

     " A grande polêmica movida pelo instigante e provocativo livro é que não só ele expunha os perigos do DDT, mas questionava de forma eloqüente a confiança cega da humanidade no progresso tecnológico. Dessa forma, o livro ajudou a abrir espaço para o movimento ambientalista que começava a emergir (Pedro Roberto JACOBI. Educação Ambiental: o desafio da construção de um pensamento crítico, complexo e reflexivo. In: Educação e Pesquisa, vol.31 n.2, São Paulo May/Aug. 2005.)

Outros trabalhos foram importantes para o avanço das discussões ambientais, tais como: Este Planeta em Perigo - This Endangered Planet (1971), de Richard Falk;  Projeto para Sobrevivência -Blueprint for Survival (1972), Garrett Hardin com Explorando a Nova Ética para Sobrevivência - Exploring New Ethics for Survival (1962) e a Tragédia dos Comuns - The Tragedy of Commons (1968); Paul Erlich com A Bomba Populacional -  The Population Bomb (1968); Barry Commoner, com O Circulo Fechado -  The Closing Circle (1971). Essas obras clássicas, hoje em dia, tiveram maior repercussão na opinião pública, mas resistência nos meios empresariais e políticos.

Outra publicação muito citada e de repercussão internacional, a qual tenta quebrar a visão otimista e cornucopiana do desenvolvimento (os desenvolvimentistas) defendida pelos economistas é o Relatório “Os limites do Crescimento”-  The Limits to Growth, também, conhecido como Relatório do Clube de Roma.

Apresentei alguns capítulos do Clube de Roma (vejam na postagem com marcador Livros), pois, penso que ele é outro marco histórico reconhecido (não desconsiderando a herança do conhecimento existente, como já disse).

Fonte: http://hereditarios.livreforum.com/t27-o-clube-de-roma-o-clube-dos-300-parte-1

Historicamente, o empresário Aurelio  Peccei (Manager da Fiat, diretor da Intalconsult  e ex-presidente da Olivetti), se reuniu, para jantar (em Paris), com o cientista escocês Alexander King. Diante da preocupação com os problemas ambientais (ele escreveu O Abismo à Frente - The chasm Ahead, em 1969) teve a ideia de reunir especialistas para discussão do assunto. 

Em abril de 1968, houve uma reunião com um grupo de (30) especialistas, entre os quais economistas, políticos, físicos, educadores e industriais, de dez países, que se reuniram na Academia dei Lincei, academia a que pertenceu Galileu, de Leonardo da Vinci, em Roma e fundaram o  Clube de Roma.
A proposta do Clube de Roma era repensar a conjuntura mundial  a partir da ótica industrial, pois, a maioria era de importantes líderes empresariais.

Em 1972, foram contratados cientistas do MIT – Instituto de Tecnologia de Massachusetts, sob a coordenação da Dra. Donella H. Meadows (1941-2001) e do Dr. Dennis Meadows (1942- ), com dois objetivos: 1) obter uma visão mais sistematizada dos limites do planeta das restrições impostas à população humana e suas atividades; 2) identificar e estudar os elementos mais importantes que influenciam no comportamento dos sistemas mundiais, no longo prazo, bem como suas interações.


fonte: http://hereditarios.livreforum.com/t27-o-clube-de-roma-o-clube-dos-300-parte-1

base de discussão consistiu em cinco (5) fatores básicos, os quais determinavam e, por conseguinte, limitavam o crescimento em nosso planeta: a) rápido crescimento populacional - estoque e fluxo de populações no modelo, b) a produção agrícola e a disponibilidade de alimentos que se refletem em fome de populações (vejam são as mesmas problemáticas discutidas por Malthus, em 1798, quando publicou Um ensaio sobre o principio da população); c) devastação e exaustão dos recursos naturais não-renováveis; d) aumento da produção industrial e da poluição; e) acelerado ritmo de urbanização.

Após muita discussão, o primeiro relatório foi finalizado em 1971 com o nome “The Club of Rome Project on the predicament of mankind” – O projeto do Clube de Roma sobre o apuro da humanidade .  Foi publicado em 1972, como Os Limites do crescimento, The limits to Growth. Esse relatório é também conhecido como Relatório do Clube de Roma ou Relatório Meadows (pois, coordenado pelos cientistas americanos Dennis Meadows e Donella Meadows). Eles, com base em sistemas de informática e ferramentas matemáticas existentes para simular a interação do homem com o meio ambiente (Método da dinâmica de sistemas criada pelo Professor Dr.  Jay Wright Forrester e ampliada para a análise do mundo com o modelo World3), levaram em consideração o número de habitantes e o esgotamento dos recursos naturais, chegaram às conclusões:

A mudança tecnológica, em qualquer cenário do modelo, não alteraria de forma significativa os resultados. Se, por um lado, a utilização de energia nuclear amplia a produção, por outro lado, gerará níveis crescentes de poluição.
Vejam os gráficos: original e traduzido, abaixo.


Fonte: http://perdidanahistoria.blogspot.com.br/2012_01_01_archive.html











Fonte: http://pt.slideshare.net/loracruz/o-desenvolvimento-sustentvel-na-prtica-pnuma


Concluíram que se a humanidade continuasse com as mesmas práticas econômicas e ambientais, em menos de cem anos, os recursos se esgotariam e a humanidade entraria em um colapso.

De maneira sucinta, as teses e conclusões básicas do grupo de pesquisadores (1972, p.20) são:

1. Se as atuais tendências de crescimento da população mundial industrialização, poluição, produção de alimentos e diminuição de recursos naturais continuarem imutáveis, os limites de crescimento neste planeta serão alcançados algum dia dentro dos próximos cem anos. O resultado mais provável será um declínio súbito e incontrolável, tanto da população quanto da capacidade industrial.

2. É possível modificar estas tendências de crescimento e formar uma condição de estabilidade ecológica e econômica que se possa manter até um futuro remoto. O estado de equilíbrio global poderá ser planejado de tal modo que as necessidades materiais básicas de cada pessoa na Terra sejam satisfeitas, e que cada pessoa tenha igual oportunidade de realizar seu potencial humano individual.

3. Se a população do mundo decidir empenhar-se em obter este segundo resultado, em vez de lutar pelo primeiro, quanto mais cedo ela começar a trabalhar para alcançá-lo, maiores serão suas possibilidades de êxito.

A mudança tecnológica, por sua vez, em qualquer cenário do modelo, não alterava de forma significativa os resultados encontrados. Se, por um lado, a utilização de energia nuclear ampliava a produção, por outro lado, gerava níveis crescentes de poluição.

Propuseram, portanto, o Crescimento Zero. Como foi publicado em 1972, alguns meses antes da Conferencia de Estocolmo ele teve enorme repercussão sobre a mesma.


Fontes: 
- http://www.infoescola.com/ecologia/agrotoxicos/
- http://www.clubedaquimica.com/index.php?option=com_content&view=article&id=116:a-historia-do-ddt&catid=35:historias-da-quimica&Itemid=48
- McCORMICK, John. Rumo ao Paraíso: A História do Movimento Ambientalista. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1992.
- MEADOWS, Donella H.; MEADOWS, Dennis L.; RANDERS, Jorgen; BEHRENS III, W. W. Limites do Crescimento: Um relatório para o projeto do Clube de Roma sobre o dilema da humanidade. São Paulo: Editora Perspectiva, 1973

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