sábado, 13 de outubro de 2007

A declaração de Cocoyoc

De maneira geral, os estudos que tratam do desenvolvimento sustentável enfatizam que as preocupações surgem por volta da década de 1960 por influência pelas idéias naturalistas dos hippies que, em grande parte, defendiam a convivência harmônica com a natureza.
Primeiro, a idéia do desenvolvimento sustentável surgiu com o conceito de ecodesenvolvimento, proposto em 1973, por Maurice Strong. Segundo, a preocupação não é recente e vários fatos e ações contribuíram para seu surgimento. Entre estes, citam-se:

- Criação do Parque Nacional do Yellowstone em 1872 (EUA)
- Acordo internacional de proteção às focas e as baleias
- Preocupação com a chuva ácida na Inglaterra, desde o final do século XIX
- Preocupações ecológicas por parte de cientistas que visitaram o Brasil na época do Império
No ano 1962 surgiu o livro “The Silent Spring (A Primavera Silenciosa), de Rachel Carson e, em 1968, o artigo The Tragedy of the Commons (A Tragédia dos Bens Comuns), de Garrett Hardin, importantes fontes de referências dos estudiosos até hoje, que introduziram novas preocupações, relações e paradigmas (discutirei brevemente em meu blog).
Soma-se a isso que uma nova série de catástrofes ocorreram e alertaram ainda mais para o problema: descobriu-se que a droga talidomida causa má-formação congênita em recém-nascidos, o navio Torrey Canyon derramou petróleo ao longo da pitoresca costa norte da França e cientistas suecos afirmaram que a morte de peixes e outros organismos em milhares de lagos da Suécia era resultado do longo alcance de poluição atmosférica vinda da Europa Ocidental.
No final da década de 1960, nos países comunistas ocorria a destruição do meio ambiente em nome da industrialização. Em países em desenvolvimento, a preocupação com o meio ambiente era vista como um luxo do Ocidente. A Primeira Ministra da Índia, Indira Ghandi, afirmava “A pobreza é a pior forma de poluição”.
Em 1972, temos a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972 . Após, a Conferência de Estocolmo, quer dizer, em 1973, foi proclamado por Maurice Strong o termo “ecodesenvolvimento”. O termo se referia, inicialmente, aos desafios suscitados pela situação característica das zonas rurais dos países em desenvolvimento. Tinha concepção anti-tecnocrática e defendia uma gestão mais racional dos ecossistemas locais, que deveria incluir a valorização do know-how e da criatividade endógena das comunidades.

Esta versão inicial do conceito foi re-elaborada, no ano seguinte, ou seja 1973, por Ignacy Sachs, que propos a nova versão de ecodesenvolvimento. Referiu-se, primeiramente, a um “estilo” de desenvolvimento aplicável a projetos localizados tanto em áreas rurais quanto urbanas, orientada prioritariamente pela busca de satisfação de necessidades básicas e pela promoção da autonomia (self-reliance) das populações envolvidas no processo.
Posteriormente, em um segundo momento, o conceito de ecodesenvolvimento passou a designar também um enfoque de planejamento participativo de estratégias plurais de intervenção, adaptadas a contextos socio-culturais e ambientais específicos e incluia os princípios de solidariedade sincrônica (com as gerações atuais) e diacrônica (com as gerações futuras).

Em 1974, foi realizado um simpósio de especialistas presidido por Barbara Ward, em Cocoyoc, no México. Organizado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUMA e pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).
Na reunião, houve avanços no modelo sugerido por Sachs, pois, realizou-se a conexão entre explosão populacional, pobreza, degradação e a responsabilidade dos países desenvolvidos com esses problemas, devido a seu elevado nível de consumo, desperdício e poluição e a necessidade e a urgência da mudança dos padrões de produção e consumo dos países industrializados, assim como a busca por maneiras de se construir na prática o que Sachs denomina como ecodesenvolvimento.
O documento produzido de oito páginas, a Declaração de Cocoyoc, é considerado fundamental para a construção da nova percepção da relação entre sociedade e natureza, incorporando à discussão a idéia de que existiam limites ambientais e sociais para o desenvolvimento que deveriam ser respeitados.
A Declaração falou em uma “nova ordem econômica mundial” e em “consumo sustentável”. Buscou alertar aos estadistas para que eles procurassem satisfazer as necessidades humanas básicas para todas as pessoas, mas sem colocar em risco os limites do meio ambiente. Esta conduta implicou em uma nova forma de manejo dos recursos naturais, agora numa escala global e com base no princípio da solidariedade com as futuras gerações.
Afirma que o fracasso da sociedade mundial em fornecer "uma vida segura e feliz para todos” não é causada por qualquer carência presente de recursos, mas sim pela má distribuição e uso dos recursos disponíveis, tanto do ponto de vista econômico quanto social.
De acordo com a Declaração "el desarrollo no deberia estar limitado a la satisfacion de las necesidades basicas. Hay otras necesidades, otras metas y otros valores ; o derecho a dar y recibir ideas y estimulos. Hay una profunda necesidad de participar en la formacion de la base de existencia de uno mismo, y hacer alguna contribucion en la consolidacion del futuro del mundo (citado por Gutierrez-Espeleta, 2002, p. 110)
A declaração enfatizou o crescimento harmônico diferenciado para os paises, em função das caracteristicas culturais e ecologicas de cada região. A busca de diferentes caminhos de desenvolvimento teria como requisito as mudanças nas esferas politicas, economicas e sociais.
O documento contribuiu para a discussão sobre desenvolvimento e meio ambiente, destacando as seguintes hipóteses:
a) a explosão populacional tem como uma das suas causas a falta de recursos de qualquer tipo; pobreza gera o desequilíbrio demográfico;
b) a destruição ambiental na África, Ásia e América Latina é também o resultado da pobreza que leva a população carente à superutilização do solo e dos recursos vegetais;
c) os países industrializados contribuem para os problemas do subdesenvolvimento por causa do seu nível exagerado de consumo. Não existe somente um mínimo de recursos necessários para o bem-estar do indivíduo; existe também um máximo. Os países industrializados têm que baixar seu consumo e sua participação desproporcional na poluição da biosfera.
d) O problema básico de hoje em dia não é o de uma escassez material absoluta, mas sim de má distribuição e uso, do ponto de vista econômico e social.
e) A tarefa dos estadistas é orientar os países em direção a um novo sistema mais capaz de satisfazer os limites internos das necessidades humanas básicas para todas as pessoas do mundo, e fazê- lo sem violar os limites externos dos recursos e do meio ambiente do planeta.
f) Os seres humanos têm necessidades básicas: alimentação, abrigo, vestimentas, saúde, educação.
g) Qualquer processo de crescimento que não leve à sua realização – ou pior, que a impeça – é uma paródia da idéia de desenvolvimento.
i) Precisamos todos redefinir nossos objetivos, ou novas estratégias de desenvolvimento, ou novos modos de vida, incluindo um padrão mais modesto de consumo entre os ricos.
A Declaração de Cocoyoc termina assim:
“O caminho à frente não se encontra no desespero pelo fim dos tempos nem em um otimismo fácil resultante de sucessivas soluções tecnológicas. Ele se encontra na avaliação cuidadosa e imparcial dos ‘limites externos’, na busca conjunta por meios de alcançar os ‘limites internos’ dos direitos humanos fundamentais, na construção de estruturas sociais que expressem esses direitos e no trabalho paciente de elaborar técnicas e estilos de desenvolvimento que aprimorem e preservem o nosso patrimônio terrestre.”

A Declaração re-afirma a esperança de que o respeito pelos direitos humanos fundamentais, a preservação do planeta e a fé no surgimento de novas técnicas e estilos de desenvolvimento que garantirão nossa herança planetária.

Bibliografia:
Gutierrez-Espeleta, E E (2002)- Indicadores sociales: una breve interpretatión de su estado de desarrollo.In Sojo, Carlos (org)- Desarrollo social en America Latina: temas y desafios para las politicas publicas. San Jose, Costa Rica. FLACSO: Banco Mundial.

Um comentário:

Fe disse...

Olá Amalia,
Gostaria de deixar um recado porque aprecio teu blog e o utilizo como fonte de informações em muitos ensaios!
Parabéns pelo teu trabalho, tu és uma das pessoas que fazem sua parte e mais um pouco pelo ambiente em que vivemos.

Fernanda Nogueira