Como comentei, anteriormente, a sustentabilidade ambiental e o
crescimento econômico não são temas atuais. Sob diversos enfoques (alimentos,
em Malthus; raridade e abundância, em Adam Smith; externalidades, em Pigou; bens
públicos puros, em Samuelson e Musgrave; direitos de propriedade, com Coase e
as evoluções contemporâneas), eles vêm sendo tratados e refinados, teoricamente,
para se adequar e avançar nas explicações da complexidade que nos circula.
É interessante esse processo, na teoria econômica, pois, de certa forma,
ao tratar do pensamento econômico, em diversas disciplinas, a própria
compreensão histórica e a ligação com o ambiente de exaustão e impactos
ambientais foram se afastando da discussão de crescimento, desenvolvimento e desenvolvimento
sustentável (acredito que poucos alunos de economia conheçam os conteúdos e as suas
discussões). Nas questões ambientais, enveredou-se por enfoques mais pontuais
como: economia verde, economia dos recursos naturais, economia do meio
ambiente, economia ecológica, entre outras denominações, em que pouco se
discute ou se coloca em xeque os modelos de desenvolvimento em curso.
Não me coloco contra essas abordagens, pelo contrário, elas são necessárias para a tomada de decisão na gestão pública e privada. O pensamento econômico predominante defende que, sob o sistema de livre mercado (neoliberal) e, teoricamente, com o pressuposto de concorrência pura, o sistema de preços (que é divulgado devido a perfeita informação a custo zero) assinala a escassez ou a abundância de tal forma que, via mercado ou via intervenção estatal, se faz a correção e a economia tende ao equilíbrio e os recursos naturais são sustentáveis.
Pode-se resumir que:
A sustentabilidade de uma economia ocorre na medida em que seu estoque de
capital, que define o fluxo de bens e serviços futuros, seja mantido pelo menos
constante.
A escassez de recursos naturais, se precificada adequadamente, seria
resolvida via substituição e desenvolvimento tecnológico.
Com tantos pressupostos a economia funciona perfeitamente. Contudo, o que ocorre no real?. Penso que é importante entender por que existe uma ruptura no tratamento da natureza e do meio econômico, quando um é o suporte fundamental para o outro.
Discuto a evolução da do desenvolvimento sustentável, que passo a explorar. Essa vertente, contudo, não é discutida pelo maistream econômico. Vou recuperar um pouco dessa história.
A) OS RELATÓRIOS E AS CONFERÊNCIAS: O CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Até os anos 1960, era predominante a idéia de que os recursos naturais eram inesgotáveis e deviam servir à produção.
Essa forma de tratar o meio ambiente era coerente com a idéia do
desenvolvimento, entendido como crescimento, ou seja, a reprodução da natureza
e da economia eram vistos como infinitos e a natureza não era barreira ao
crescimento. Obviamente, quando o crescimento populacional e da produção impactaram
sobremaneira o meio ambiente, este deixou de ser tratado como infinito e objeto
independente da reprodução do homem e da riqueza, quer dizer, se torna evidente
que há limites para o crescimento econômico.
Sob a
influência do relatório “Limites do crescimento” ou relatório do Clube de Roma
(que tratou de 5 temas: crescimento
populacional; a produção agrícola e a disponibilidade
de alimentos; devastação e
exaustão dos recursos naturais; aumento da produção industrial e
da poluição), publicado em 1968 teve impacto internacional e serviu/conduziu os
debates travados na Conferencia de 1972.
Recuperando
a história, na Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente humano,
conhecido como a Conferência de Estocolmo, realizada de 5 a 15 de junho de
1972, houve as importantes constatações de que o Homem faz parte, depende e
modifica o meio ambiente. O relatório está
disponível em: http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/estocolmo1972.pdf
Nessa conferência, foi questionado, pelos países desenvolvidos (e com base, inclusive, no relatório), o modelo de desenvolvimento sócio-econômico e se propôs limitações a utilização dos recursos e medidas preventivas ao crescimento populacional. Contudo, a posição do Brasil e dos países subdesenvolvidos era de que estes se deparavam com um ambiente marcado pela miséria, problemas de moradia, dívidas e almejavam se inserir no mercado internacional. Particularmente, o Brasil que vivia o Milagre Brasileiro, portanto, a defesa era de que eles possuíam também o direito de poluir, pois, os impactos ambientais estavam diretamente associados ao desenvolvimento econômico (era a defesa do crescimento – confundido com desenvolvimento- a qualquer custo). Nesse contexto, as soluções propostas na conferência, como o crescimento zero, serviriam de barreiras ao crescimento. Resultado, apesar de sua importância histórica, os princípios firmados viraram letra morta.
Seguiram-se várias outras conferências que radicalizavam na questão da exploração do meio ambiente e do homem. Também houve vários avanços, contudo, eram pontuais frente ao surgimento do Relatório Brundtland (em homenagem a Gro Harlem Brundtland, ex-primeira ministra da Noruega, que presidiu a comissão da ONU que o produziu) ou Nosso Futuro Comum.
O relatório foi publicado, em 1987, após três anos de audiências com líderes de governo e organizações de vários países, desenvolvidos e em desenvolvimento, sobre temas como população e recursos humanos, segurança alimentar, espécies e ecossistemas, energia, industria, urbano, transferência de tecnologias e desenvolvimento sustentável em geral.
Você pode encontrar o relatório (em inglês) em
<http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/N8718467.pdf>
Em português ele está acessível em:
<http://pt.scribd.com/doc/12906958/Relatorio-Brundtland-Nosso-Futuro-Comum-Em-Portugues>
No relatório se constata que o modelo de crescimento econômico adotado (fordista e omisso nas questões ambientais) gerou enormes contradições. Se, por um lado, aumentou a riqueza e os bens e serviços no mundo, por outro lado, a miséria, a degradação ambiental e a poluição também aumentaram.
O conceito de desenvolvimento sustentável é decorrente da opção do Homem por uma
nova relação com o meio ambiente e a decorrente evolução da tecnologia, como afirmado
no relatório.
Uma
proposição aceitável, universalmente, é que o relatório tem como uma de suas
premissas o reconhecimento da “insustentabilidade” da trajetória adotada e a
necessidade de correção da rota do atual padrão socieconômico de
desenvolvimento. Além disso, propõe a possibilidade de um novo modelo socialmente
justo, economicamente viável e ecologicamente sustentável.
Outra questão importante
é a realidade retratada pelo relatório que apresenta as relações de dependência
existentes e a conseqüente (inevitável?) deterioração ambiental decorrente do
aumento das necessidades de consumo, particularmente, dos países desenvolvidos.
Contraditoriamente, a solução está no contínuo crescimento dos que provocam os
desequilíbrios, ou seja, os que podem crescer são os países desenvolvidos. Devido
a dependência econômica existente, estes irradiariam o crescimento para os
países pobres. Cabe, no plano mundial, o combate à pobreza.
Vejam, os encontros
anteriores atacavam diretamente o consumo dos desenvolvidos e defendiam medidas
corretivas para todos (o que gerou reação dos subdesenvolvidos) agora, o
relatório não esconde a situação dos desenvolvidos, mas, a partir da visão de
que a pobreza impacta o meio ambiente, a solução de combate à mesma é aceita
mundialmente.
Conseqüentemente,
como já afirmei anteriormente no blog, ocorre a tentativa de conciliar
preservação ambiental com crescimento econômico, ou seja, uma terceira via que
tenta direcionar e fugir das posições radicais dos encontros anteriores.
Enrique Leff, no livro Ecologia y capital (1994, p.19) afirma que
o discurso da sustentabilidade [sustainability] torna-se ambivalente, pois, de um lado se traduz na internalização das condições ecológicas, que sustenta uma racionalidade ambiental [sustentable]; de outro lado, dá suporte ao processo econômico que sempre negou a natureza [sostenible]. Termina, com uma frase que considero fundamental: “Desenvolvimento Sustentável” no discurso neoliberal objetiva propiciar crescimento Sustentado: em tese, é a ecologização da produção e capitalização da natureza”.
Leff, no texto La Geopolítica de la Biodiversidad y el Desarrollo Sustentable:
economización del mundo, racionalidad ambiental y reapropiación social de la
naturaleza ( 2005, p.14) defende que:
“La geopolítica de la globalización se ha centrado en las falsas virtudes del mercado y de La capacidad empresarial para guiar y alcanzar los objetivos del desarrollo sostenible. Se confiere al mercado la capacidad de internalizar los costos ambientales y de absorber actividades productivas sobre el capital natural y los servicios ambientales que hasta ahora han sido campos tradicionales de apropiación y manejo de un patrimonio y bienes comunales que funcionan fuera del mercado, para transformarlos en nuevas oportunidades de negócios”.
Existem, portanto, dois discursos que se complementam (e se contradizem,
ao mesmo tempo): o de que o Estado tem papéis definidos no controle dos
impactos ambientais (multas, incentivos, subsídios, ou seja, controle e regulamentações)
e que a lógica do mecanismo de mercado é suficientemente eficiente para se
alcançar a alocação ótima de recursos, requerendo apenas mecanismos estatais
reguladores e atuação educativa das ONGs.
Como já disse, a própria história econômica do século XX mostrou,
tanto pelos impactos ambientais quanto pelos desequilíbrios socioeconômicos
locais e mundiais que a soma das buscas de “ótimos” individuais, por parte de
cada agente produtivo raramente leva a um “ótimo social” ou ao “ótimo
coletivo”. Essa constatação já foi
defendida por Garrett Hardin (1968) – com base no trabalho do matemático amador
William Forster Lloyd, publicado em 1833 – publicou The Tragedy of the
Commons, na revista científica Science, n. 162, p.1243 a 1248. . No
artigo, Hardin argumenta que o livre acesso e a demanda crescente e irrestrita
de um recurso finito leva a extinção, superexploração de um recurso finito e,
para evitar essa situação são necessários vários mecanismos e o planejamento.
Veja o artigo em < http://www.geo.mtu.edu/~asmayer/rural_sustain/governance/Hardin%201968.pdf>
B - A RIO-92
O conceito de desenvolvimento sustentável, presente no relatório Nosso
futuro Comum, foi incorporado como princípio durante a Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,conhecida como a Cúpula da Terra
de 1992, a Eco-92 ou Rio-92.
A Rio-92, convocada
pela Assembléia Geral das Nações Unidas de
1988, teve como
objetivo discutir a situação ambiental no mundo desde 1972, estabelecer
mecanismos de transferência de tecnologias não-poluentes aos países
subdesenvolvidos, examinar formas de incorporar critérios e regras ambientais
ao processo de desenvolvimento; estabelecer um sistema de cooperação
internacional para prever ameaças ambientais; prestar socorro em casos
emergenciais e reavaliar o sistema de organismos da ONU voltados ao meio
ambiente (FOLHA DO MEIO AMBIENTE, 1999: 05).
Foram realizadas
duas conferências simultâneas:
a) A conferência oficial, ou seja, a Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento e Meio Ambiente, que reuniu 172 países e teve a participação de
112 Chefes de Estados, razão pela qual as Nações Unidas passaram a denominá-la
de Conferência de Cúpula da Terra;
b) O Fórum Global, que foi uma
conferência paralela composta por mais de 1.300 Organizações Não-Governamentais
de 108 países e participação de mais de 3000 pessoas do mundo inteiro, reunidas
em 45 tendas, com o desafio de “o desafio de imaginar e propor alternativas à
iniqüidade de um modo de vida global em que, por exemplo, 20% da população,
habitante do Hemisfério Norte, consome 80% dos recursos planetários e agradece
com a emissão de 75% da poluição ambiental (introdução do Tratado das ONGS). que
aprovou a Carta da Terra (disponível em http://www.cartadaterrabrasil.org/prt/text.html).
Dentre as
40 declarações discutidas e acordadas no Fórum Global das ONGs, tem-se, só para chamar a atenção, a Carta
da Terra e a Declaração do Povo da Terra, pelo Fórum que declarava que esta era
“fruto das discussões e que as deliberações oficiais escolheram negligenciar
muitas das mais fundamentais causas da acelerada devastação ecológica e social
do nosso planeta. Enquanto se ocupam em ajustar o sistema econômico que serve
aos interesses de curto prazo de alguns poucos
às custas da maioria, a liderança por uma mudança mais fundamental
recaiu, por desistência, sobre as organizações e movimentos da sociedade civil.
Nós aceitamos este desafio. (vide http://www.crescer.org/glossario/doc/179.pdf)
Vou
discutir isso, em momento posterior.
Na reunião oficial, foram assinadas as
seguintes convenções:
1. Convenção sobre a Diversidade Biológica (disponível em http://www.mma.gov.br/estruturas/sbf_chm_rbbio/_arquivos/cdbport_72.pdf)
;
2.
Convenção quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (disponível em http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/3996.html),
3. Declaração
de princípios sobre florestas – esta declaração foi tão polemica que seu nome
oficial foi “Declaração oficial de princípios juridicamente não vinculativa
para um consenso global sobre a gestão, conservação e desenvolvimento
sustentáveis de todos os tipos de florestas”, isso porque a questão fundamental
era a soberania nacional como se pode concluir ao ler os princípios 1 e 3 – (disponível
em https://dspace.ist.utl.pt/bitstream/2295/39628/1/A21%20-%20PT.pdf
, veja a partir da página 557)
4. A
Declaração do Rio sobre Ambiente e Desenvolvimento, que é a declaração final
com 27 princípios acordados, que objetivavam estabelecer um novo tipo de presença do homem na Terra,
através da proteção dos recursos naturais e da busca do desenvolvimento sustentável e de melhores condições
de vida para todos os povos. (disponível em< http://www.mma.gov.br/port/sdi/ea/documentos/convs/decl_rio92.pd>)f
Além disso,
foi aprovada a Agenda 21, que estabelece diretrizes a serem implementadas pelos governos, agências de desenvolvimento,
organizações das Nações Unidas e grupos organizados. Ela contém 4 sessões, 40
capítulos, 115 programas e aproximadamente 2500 ações a serem implementadas (disponível
em (<http://www.ambiente.sp.gov.br/agenda21.php>)
(Todos esses
documentos estão disponíveis em (https://dspace.ist.utl.pt/bitstream/2295/39628/1/A21%20-%20PT.pdf
)
vou aprofundar um pouco mais, adiante.
Tive muita dificuldade com a formatação desta publicação. Desculpem-me se ela não ficou muito dentro dos padrões.
Tive muita dificuldade com a formatação desta publicação. Desculpem-me se ela não ficou muito dentro dos padrões.
Até, por enquanto
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